O que é uma “Cidade das crianças”?

É muito possível que seu pensamento tenha remetido você àquele parque de diversões que está localizado na cidade de São Bernardo do Campo, na região metropolitana de São Paulo. Ele foi inaugurado em 1968 e fez muito sucesso.

Ainda que seja uma opção de passeio e lazer para os pequenos, este não é o tema central deste artigo. Estamos nos referindo a uma iniciativa que propõe a inclusão do olhar da criança na elaboração e execução de projetos urbanísticos. 

A ideia é que haja uma transformação nos conceitos das cidades, para que o direito de brincar seja exercido pelas crianças de forma mais profunda e integral. Este conceito nasce a partir do pensamento de muitos estudiosos da infância, mas especialmente orquestrado por Francesco Tonucci.

Quem é Francesco Tonucci?

Pensador e psicopedagogo, Francesco Tonucci nasceu em 05 de julho de 1940 em Fano, na Itália. Também conhecido pelo apelido de “Frato” (originado das primeiras sílabas de seu nome), é uma das maiores referências da valorização da infância.

Aproximou-se do cotidiano escolar nos anos 60, quando passou a atuar como professor, desenvolvendo um olhar crítico aos modelos convencionais de escola, defendendo a concepção de uma escola que fosse para todos e também para cada um.

A partir deste pensamento, desenvolveu a iniciativa “Cidade das Crianças”, que foca as ações na transformação das cidades partindo do olhar das infâncias que ali habitam, onde as políticas públicas tenham um olhar mais acolhedor aos direitos de brincar.

O brincar como base estrutural

Assim como Tonucci, muitos outros pensadores compartilham do pensamento de que brincar não é apenas um direito da criança. O brincar é uma fonte inesgotável de construção de saberes que farão parte da formação cultural e social de todos nós.

Leia mais sobre o brincar em: O BRINCAR E O APRENDIZADO

Não existe uma forma mais original e própria de construir sua própria imagem, de sua visão do mundo e das relações pessoais e com as coisas, do que de forma livre e autônoma, brincar. A criança que vive plenamente esse movimento, solidifica seus desejos, seus sonhos e exercita sua imaginação de forma construtiva.

Ao brincar, a criança se descobre parte de seu próprio mundo a partir do exercício de seus sentidos. Manusear objetos, observá-los e tocá-los para conhecer suas texturas, experimentá-los em seus aromas e entregar às suas imaginações todas as possibilidades de transformá-los.

De acordo com o professor, escritor e pesquisador “Severino Antônio”:

“A infância não é uma preparação para a vida adulta, não deve ser pensada assim. Devemos pensar que cada criança recria a vida humana”.

A partir desta visão de protagonismo infantil, e da concepção de que o brincar é a base da construção de uma vida plena, é que se alicerça a iniciativa da “Cidade das Crianças”, pensada por Tonucci, e adotada por cidades como Rosário (Argentina) e Pontevedra (Espanha).

O Brasil e suas iniciativas

Este projeto já chegou ao Brasil e assim como a pioneira Boa Vista, no Estado de Roraima, a cidade de Jundiaí, no Estado de São Paulo promoveu em 2018 a integração entre as unidades de Gestão e deu início aos programas “Comitê das Crianças” e “Ruas de Brincar”.

O “Comitê das Crianças” promove a inclusão dos pequenos nos debates das políticas públicas para a infância ao longo do ano, para apresentação ao Executivo Municipal. Essas crianças são sorteadas dentre todas as regiões do Município. 

Já o “Ruas de Brincar” consiste no fechamento temporário do trânsito de algumas vias, sob os cuidados da comunidade, com a finalidade de permitir que as crianças ali brinquem livremente, minimizando alguns dos riscos experimentados pelas grandes cidades.

O amadurecimento da ideia

Assim como toda e qualquer iniciativa inovadora, é preciso que haja inicialmente uma conscientização sobre a importância das iniciativas para que o interesse surja a partir das reflexões e dos debates sobre sua execução e implantação.

Todos os envolvidos nos projetos educacionais devem estar engajados. Gestores, educadores, famílias e a comunidade como um todo. Mas especialmente deve haver a abertura de espaço de escuta atenta para os interesses e os direitos da criança.

Não podemos perder de vista que, para que haja maior aproximação com o direito de brincar, deve haver um movimento de entrega de protagonismo da criança não apenas na teoria, mas efetivamente permitir sua participação na construção dos projetos, para que as cidades também pulsem os ritmos infantis.

Uma possibilidade de exercício em menor escala do projeto “Cidade das Crianças”, é promover em nossas escolas alguma iniciativa semelhante. Quem sabe pensarmos em dar-lhes escuta e voz quando pensarmos em reformar ou promover alguma transformação em nossos ambientes.

De alguma forma, fazer com que nosso discurso sobre a importância do protagonismo e a escuta da criança deixe de ser uma teoria utópica para fazer morada em nossa realidade. As crianças carregam em si um potencial que não pode ser olvidado e conhecem, como ninguém, os caminhos para trilhar sua história.

Se você conhece alguma iniciativa que contemple a participação direta das crianças na construção dos espaços de suas cidades ou de suas escolas, compartilhe conosco para que esse ingrediente seja adicionado em nossas receitas de uma educação melhor e mais inclusiva.

Vamos compartilhar?